Esta é uma meditação sobre o amor adaptada do
Visuddhimagga:
Que eu possa eu estar em paz, feliz e leve
de corpo e espírito.
Que ele/ela possa estar em paz, feliz e
leve de corpo e espírito.
Que eles possam estar em paz, felizes e
leves de corpo e espírito.
Que eu possa viver em segurança e livre de
males.
Que ele/ela possa viver em segurança e
livre de males.
Que eles possam viver em segurança e
livres de males.
Que eu possa estar livre de raiva,
aflições, medo e ansiedade.
Que ele/ela possa estar livre de raiva,
aflições, medo e ansiedade.
Que eles possam estar livres de raiva,
aflições, medo e ansiedade.
A prática da meditação sobre o amor deve ter início por nós mesmos
("eu"). Enquanto não formos capazes de nos amar e cuidar de nós, não podemos ser
muito úteis para ninguém. Depois, podemos dedicar a prática a outras pessoas
("ele/ela”, "eles"): primeiro, a alguém de quem gostamos; depois, a alguém que
nos é indiferente; em seguida, a quem amamos; e, finalmente, à pessoa cuja
simples lembrança nos faz sofrer.
Iniciamos essa atividade examinando a fundo o skandha da
forma, que é nosso corpo. De acordo com o Buda, o ser humano compõe-se de cinco
skandhas (elementos, ou agregados): forma, sentimentos, percepções,
formações mentais e consciência. Somos o rei, e esses elementos são nosso
território. Para tomarmos conhecimento da real situação que há dentro de nós,
devemos pesquisar minuciosamente nosso território, inclusive ver os elementos
que estão em guerra uns contra os outros. Para criarmos harmonia e conciliação
em nosso interior, tornando-o saudável, devemos compreender a nós mesmos. A
meditação sobre o amor começa quando passamos a observar e escutar
cuidadosamente enquanto pesquisamos nosso território.
De início perguntamos: como está meu corpo neste momento? Como estava
no passado? Como estará no futuro? Mais tarde, ao praticarmos a meditação sobre
alguém de quem gostamos, alguém indiferente, alguém que amamos e alguém que
odiamos, também começaremos vendo os aspectos físicos. Inspirando e expirando,
visualizamos seu rosto, seu jeito de caminhar, sentar-se e conversar; seu
coração, pulmões, rins e todos os órgãos do corpo, detendo-nos o tempo
necessário para que esses detalhes se manifestem na consciência. Mas sempre
devemos começar por nós mesmos. Quando enxergamos com clareza nossos cinco
skandhas, a compreensão e o amor surgem de modo natural, e ficamos
sabendo o que fazer e o que não fazer para cuidarmos melhor de nós
mesmos.
Verificamos se nosso corpo está em equilíbrio ou se está sofrendo de
alguma doença. Analisamos as condições dos pulmões, do coração, do intestino,
dos rins e do fígado, tomando conhecimento das suas necessidades reais. Isso nos
leva a comer, beber e agir de uma forma que demonstra amor e compaixão pelo
nosso corpo. Em geral, nos limitamos a seguir hábitos arraigados. Mas, quando
pensamos bem, constatamos que muitos desses condicionamentos prejudicam o corpo
e a mente, e é nesse momento que nos dispomos a trabalhar para transformá-los
com o objetivo de obter saúde e vitalidade.
Em seguida, passamos a observar nossos sentimentos - tanto os
agradáveis quanto os desagradáveis ou neutros. Os sentimentos fluem em nós como
um rio, e cada um deles é uma gota d'água. Olhamos com muita atenção para esse
rio, vendo como cada um dos sentimentos surge. Pensamos naqueles que até agora
nos impediram de ser felizes e fazemos o melhor possível para transformá-los.
Praticamos entrando em contato com os elementos maravilhosos, renovadores e
curativos que já existem em nós e no mundo. Dessa forma, ficamos mais fortes e
aumentamos a capacidade de nos amar e de amar os outros.
Depois começamos uma meditação sobre nossas percepções. O Buda fez a
seguinte observação: ''A pessoa que mais sofre neste mundo é a que tem muitas
percepções errôneas... E a maioria das nossas percepções é errônea." Vemos uma
cobra no escuro e entramos em pânico; mas, quando um amigo acende a luz,
descobrimos que é apenas uma corda. Precisamos saber quais são as percepções
errôneas que nos fazem sofrer. Devemos escrever a frase "Você tem certeza?" em
um pedaço de papel e pregá-lo na parede. A meditação sobre o amor nos ensina a
enxergar com clareza e serenidade, a fim de melhorarmos nossa
percepção.
Prosseguindo, devemos observar nossas formações mentais, as idéias e
tendências existentes dentro de nós que nos levam a falar e agir de determinada
maneira. Praticamos analisando intensamente para descobrir a verdadeira natureza
das nossas formações mentais - como somos influenciados por nossa consciência
individual e também pela consciência coletiva da família, dos nossos ancestrais
e da sociedade. Formações mentais perniciosas causam muita perturbação, enquanto
as que são saudáveis geram amor, felicidade e libertação.
Finalmente, examinamos nossa consciência. Segundo o budismo, a
consciência assemelha-se a um campo onde se encontram todos os tipos de sementes
possíveis - sementes de amor, compaixão, alegria e equanimidade; sementes de
raiva, medo e ansiedade; além de sementes de atenção plena. A consciência é o
depósito que contém todas essas sementes, tudo o que é possível surgir na nossa
mente. Quando a mente não está em paz, a causa pode estar nos desejos e
sentimentos que se encontram na nossa consciência armazenadora. Para vivermos em
paz, temos que estar conscientes das nossas tendências - as energias do hábito -
e dessa forma exercitar o autocontrole. Essa é a prática dos cuidados
preventivos com a saúde. Analisamos profundamente a natureza dos nossos
sentimentos para descobrir suas raízes e identificar os que precisam ser
transformados e nutrir os que proporcionam paz, alegria e bem-estar.
Certo dia, o rei Prasenajit,
de Koshala, perguntou à rainha Mallika:
- Minha querida esposa, existe
alguém que a ame tanto quanto eu?
A rainha sorriu e
respondeu:
- Meu querido esposo, existe alguém que o
ame mais do que você mesmo?"
No dia seguinte contaram ao Buda a conversa que tiveram, e ele disse:
"Vocês estão certos. Não existe ninguém no universo de quem gostemos mais do que
de nós mesmos. A mente pode viajar em milhares de direções, mas não encontrará
ninguém mais amado. No momento em que vemos o quanto é importante amar a nós
mesmos, deixamos de causar sofrimento às pessoas.”
O rei Prasenajit e o Buda
tornaram-se muito amigos. Um dia, quando estavam sentados em Jeta Grove, o rei
disse ao Buda:
- Mestre, há pessoas que pensam que se
amam, mas que constantemente se prejudicam por meio de seus próprios
pensamentos, palavras e ações. São as piores inimigas de si
mesmas.
O Buda
concordou:
- As pessoas que se ferem por meio de seus
pensamentos, palavras e ações são, na verdade, as piores inimigas de si mesmas.
Elas causam seu próprio sofrimento.
Em geral, acreditamos que a causa do nosso sofrimento está nos outros
- nos pais, no parceiro ou na parceira, nos inimigos. No entanto, por
esquecimento, raiva ou ciúme, dizemos ou fazemos coisas que causam dor a nós e
aos outros. Em outra ocasião, o Buda disse ao rei Prasenajit: "As pessoas
costumam pensar que se amam. Mas, por não terem a atenção plena, dizem e fazem
coisas que lhes trazem sofrimento.” Quando descobrimos essa verdade, deixamos de
culpar os outros por nossa dor. A partir desse momento, procuramos nos amar e
cuidar de nós mesmos, nutrindo nosso corpo e nossa mente.
Para praticar a meditação do Visuddhimagga sobre o amor,
devemos nos sentar tranqüilamente e acalmar o corpo e a respiração recitando:
"Que eu possa estar em paz, feliz e leve de corpo e espírito. Que eu possa viver
em segurança e livre de males. Que eu possa estar livre de raiva, aflições, medo
e ansiedade." A posição sentada é maravilhosa para essa prática. Quando sentados
quietamente, não ficamos tão preocupados com outros assuntos e assim podemos ver
profundamente como somos, cultivar o amor por nós mesmos e determinar a melhor
maneira de expressar esse sentimento no mundo.
A prática começa com uma aspiração: "Que eu possa ser...” Depois,
transcendemos o nível de aspiração e examinamos profundamente todas as
características positivas e negativas do objeto da nossa meditação, que, neste
caso, somos nós mesmos. Essa vontade de amar ainda não é amor. Nós nos
empenhamos intensamente, com todo o nosso ser, para compreender. Não nos
limitamos a repetir palavras nem a imitar os outros e, tampouco, a lutar em
busca de um ideal. A prática da meditação sobre o amor não é auto-sugestão. Não
basta dizermos "Amo a mim mesmo. Amo todos os seres': Se observarmos
profundamente nosso corpo, nossos sentimentos, nossas percepções, nossas
formações mentais e nossa consciência, em poucas semanas a aspiração ao amor
começará a se transformar em uma profunda intenção. O amor vai penetrar em
nossos pensamentos, palavras e ações, e perceberemos que estamos ficando em paz,
felizes e leves de corpo e espírito; que vivemos em segurança e livres de males;
e livres de raiva, aflições, medo e ansiedade.
Quando estivermos nos dedicando a essa prática, devemos observar
quanta paz, felicidade e suavidade já conseguimos. Temos que perceber se estamos
preocupados com acidentes ou com falta de sorte, além de identificar o quanto de
raiva, irritação, medo, ansiedade ou preocupação ainda existe dentro de nós. À
medida que nos conscientizamos dos sentimentos que abrigamos, nosso auto
conhecimento se aprofunda. Descobrimos então como os medos e a falta de paz
contribuem para a infelicidade e percebemos o valor de nos amarmos e cultivarmos
um coração compassivo. Em vez de sentirmos um medo generalizado de acidentes,
temos que observar como nos ferimos o tempo todo e tomar as medidas necessárias
para minimizar a doença e os males.
Precisamos observar profundamente, não só enquanto estamos na
almofada de meditação, mas onde quer que estejamos e independentemente do que
estejamos fazendo. Vivermos com atenção plena é a melhor maneira de evitar
acidentes e nos proteger. Precisamos reconhecer nosso intenso desejo de viver em
paz e em segurança, de ter o apoio de que necessitamos e praticar a atenção
plena. Talvez seja útil anotarmos algumas das nossas observações e
insights. Segundo o Buda, quando compreendermos que aqui na Terra somos
as pessoas mais preciosas para nós mesmos e das quais somos mais próximos,
deixaremos de nos tratar como inimigos. Essa prática dissolve qualquer desejo
que possamos ter de causar mágoas a nós e aos outros também.
"Que eu possa estar livre de raiva, aflições, medo e ansiedade” A
raiva é um mal que afeta todas as pessoas, inclusive nós mesmos. Quando nos
deixamos dominar por esse sentimento, a paz e a felicidade desaparecem. A vida
de algumas pessoas é consumida pela raiva. Basta que alguém esbarre nelas para
que fiquem furiosas. Isso se deve às circunstâncias ou às sementes de raiva que
vivem nesses indivíduos? Temos que observar bem a fundo nossas sementes de raiva
e olhar atentamente para aqueles que acreditamos nos terem causado sofrimento. A
meditação sobre o amor nos ajuda a compreender essas duas coisas e a abandonar
os padrões de pensamento e ação habituais que criam mais dor. Vemos que a pessoa
que nos feriu também está sofrendo muito. Contemplar seu sofrimento gera
entendimento e amor dentro de nós, e essas energias tornam a cura possível.
Quando nosso coração está aberto, o sofrimento logo diminui. A prática da
meditação sobre o amor nos liberta das nossas aflições.
(Do Livro – Ensinamentos
sobre o amor – Thich Nhat Hanh)
Maria Elisete SHALOM...
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